Ontem
resolvi tirar o dia para mim, sem pensar em nada (bah, fosse assim tão fácil
desligar esse velho e maltratado cérebro...) e fui pescar, num rio, pois lhe juro!
nunca mais chego perto do mar! Não o suporto
mais e tenho calafrio, quando sinto cheiro de salmoura... Acho que por causa da
ojeriza que me causa o sal, minha pressão arterial tem estado bem baixa, 12x7,
um menino, um menino!
Sentei-me
numa pedra com o velho cérebro em ponto-morto e uma pequena garrafa de absinto
para me garantir, pus-me a jogar a linha n’água.
Pesquei
sacos plásticos de várias e diversas cores, um sapato - pé esquerdo - número 41,
folhas de jornais das cidades rio acima (que não resisti, e tentei ler algumas
manchetes, bem coisa desse meu velho e birrento cérebro...), um lambari morto
de fome, haja vista ter mordido um anzol sem isca e um velho mapa desenhado em
couro de burro...
...que
imediatamente joguei de volta à agua e certifiquei-me que a correnteza o
arrastou para longe de meus cansados olhos. Ando farto de aventuras!
Que dia
maravilhoso!
Cercado de
lixo e distante de qualquer tipo de pensamentos, inquietações, dilemas morais,
sociais e/ou financeiros e a garrafa vazia resolvi dar a pescaria por encerrada
e voltar para a pensão, sim estou em outra, mas isso é assunto para outra carta.
Lembra-se
da francesa, pois, veja só, não tenho pensado nela nem uma única vez nas últimas
semanas e se a cito aqui foi porque vi uma foto dela no fundo da gaveta onde
guardo os papeis de cartas e o fumo de rolo para meus cigarrinhos. Voltei tão
leve da pescaria que meus pés mal tocavam o chão e nessa experiência - nessa
epifania? - acabei sendo carregado por uma lufada de vento que me fez ir para
muito, muito longe de casa
.
Seria essa
a tal da insustentável leveza do ser?
Espero não
ter deixado você, velho amigo, aflito com o urgente
escrito em vermelho no envelope. Precisava sim, urgente, compartilhar com
alguém, esse dia tão ditoso, venturoso e glorioso – salve salve! Penso ouvir um
coro de querubins enquanto traços essas emocionadas linha...
P.S. Do
alto, enquanto ascendia com o ar quente, achei ter visto pegadas de gigantes,
mas sabemos (não sabemos?) que gigantes não existem, certo? Aguardo
confirmação. Nesse meio tempo levarei o lambari ao taxidermista.
P.S².
Amanhã descerei o rio atrás do daquele mapa, mal dormi essa noite pensando
nele.
P.S³.
Preciso dar um jeito de livrar-me de meu cérebro. Estou aberto a sugestões.
2 comentários:
Gosto dessa sua narrativa
O senhor é qee muito bom gosto.
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