2013/02/21

ELOCUBRAÇÕES



Seis horas, acordo e me deparo com o chão coalhado de baratas mortas, suas pernas finas tremendo ao vento que entra pela janela.

As cortinas dançam com a mesmo aragem.

Essa cena me faz voltar no tempo e me lembrar de frei Justino, - que Deus o tenha! - num domingo na hora da comunhão de repente quedou-se paralisado, em choque com a hóstia levantada na mão direita, olhos esbulhados olhando em direção à assistência, babando começou a murmurar para o coroinha:

- Tire esse cágado da igreja, tire esse cágado da igreja...

O mais patético era que não havia cágado nenhum na igreja, o pobre homem surtou, enlouqueceu, e foi retirado da igreja á base de muito calmante...

Volto - essas minhas idas ao passado me dão vertigem - ao presente e as baratas continuam ali no chão, mortas de barriga para cima.

Desvio-me delas, senão com nojo, com cautela...

O sol promete mais calor, a continuar esse clima assim logo, os vizinhos me encontrarão morto, duro e suado na cama, e tal e qual essas “Periplaneta americana”- eu as odeio, mas as conheço - em decúbito ventral e como o velho Justino, de olhos esbugalhados.

Nunca mais tive notícias de frei Justino!

Vou à cozinha, reviro o armário, acho o inseticida que usei à noite passada, leio as instruções.

Penso com meus botões:

- Arma de destruição em massa...

Resolvo jogar esse veneno fora. Não quero em minha consciência os fantasmas de meu passado me assombrando a cada inseto morto – e há tantos nessa cidade!

Enquanto jogo o veneno no lixo decido-me:

- Domingo vou à missa!



2013/02/15

O ELEVADOR



Ding.

A porta do elevador abriu. Décimo terceiro andar, estava escrito em letras vermelhas na placa defronte .

Décimo terceiro andar, aqui estou. Sim, aqui, agora preciso sair do elevador, respiro fundo e...

...dou um passo à frente, a porta ameaçou fechar, mas minha perna esquerda a impediu. Doeu, é possível que o joelho inche à noite.

Permaneci parado.

Indagava-me se deveria seguir em frente, sair de vez do elevador, dar o passo decisivo, seguir pelo corredor, parar em frente ao apartamento número X, tocar a campainha...

Logo vai escurecer.

As promessas são quase palpáveis, sinto que posso tocá-las, pegá-las e guarda-las em meu bolso.

O que ela deve estar vestindo a essa hora?

- Aquele tafetá verde? Quimono de seda branca com aqueles dragões vermelhos? Preparando um sushi? – rio-me amargamente dessas perguntas.

Seu perfume... Quase poderia senti-lo nas paredes, no tapete... Se estendesse a mão poderia pegá-lo e guardá-lo dentro de meu lenço...

Ding. Ding, Ding.

Alguém está chamando o elevador.

Preciso me decidir.

Ding. Ding, Ding.

Desço.

Lá fora o sol ainda brilha, mas dentro de mim uma chuva torrencial desaba sobre minha cabeça, a água chega a escorrer pelos meus sapatos.

O sax da música do elevador segue em minha cabeça fazendo a trilha sonora do meu fracasso.

- Esse maldito Kenny G e suas músicas...

Deixo pela rua, que agora escurece, marcas de pegadas úmidas pelo chão. (chuap-chuap-chuap)

Ao dobrar a esquina, antes de pegar o ônibus jogo fora o seu endereço, sei que demorará me esquecer desse dia. Se ao menos chovesse fora de mim poderia derramar essas lágrimas que agora me afogam por dentro.

- Sabia, 13 nunca me deu sorte!



2013/02/13

CARNAVAL PASSOU


O bloco passou

A música acabou

As garrafas esvaziaram

Ela se foi

E só ficaram esses confetes colados na sua pele