- Na sua casa ou na minha?
- Na minha não dá, minha mãe está lá, digo, eu moro com ela, e depois do fim do casamento não fica bem eu levar outro homem para lá...
- Pois é, entendo...
- Por que não na sua casa?
- Você está louca? Minha mulher e filha não são motivos suficientes para você?
- Motel então?
- Com que “roupa”? Estou sem um tostão...
- Como vamos fazer então?
- Juro que não sei... Estou tentando pensar...
- Como “tentando” pensar?
- Ereção...
- Hããããã...?
- Deixa pra lá. Já está passando mesmo – diz acabrunhado.
- Deixa pra lá o quê? Eu?
- Você? Não! Nunca? Você...
- Você o quê? Vamos desembucha... Estou vendo que esse nosso caso não tem futuro! – Faz beicinho e finge chorar.
- Não, não chore, não complique mais essa situação...
- Eu estou complicando “nossa situação”? – Faz que chora ainda mais.
- É que estou sem dinheiro, sem cartão de crédito, sem vale refeição, sem...
- Sem vontade e sem coragem! – completa nervosa.
- Você não entende a minha situação...
- A sua situação, os seus problemas, sempre os “seus” os “seus”, e eu?
- Você está me pressionando...
- Agora eu estou te pressionando! Só falta dizer que essa chuva também é culpa minha... – espirra e chora.
- Pronto! Achei a solução! – dá um tapa na testa e ri.
- Qual foi a sua grande idéia agora?
- Vamos para o hospital, você chega com febre e ficamos no mesmo quarto!
- Que febre? Que febre? Quem está com febre?
- Você. É, ficamos mais um pouco nessa chuva e você pega um resfriado, começa a espirrar, tossir e ficar com começo de pneumonia...
- Acabou! – grita – Chega. Fim. Isso não tem mais futuro, se é que já teve algum. Tanto homem no mundo e fui escolher logo você casado, duro e louco.
- Louco por você.
- Não comece com essa cantada barata, você não vai mais me enrolar, enganar. E pare de me abraçar, sei que isso não é carinho, você quer é se esquentar em mim. – espirra e começa a tossir mais forte ainda.
- Olha lá, olha lá, já está começando a piorar. Logo, logo vem a gripe e depois, com sorte uma pneumonia. Vamos ficar mais um pouco aqui na chuva.
Passa um ônibus e ele a leva ao meio-fio, o coletivo passa em alta velocidade e joga a água da rua nela, pois ele esconde-se atrás dela para não se molhar.
- Viu, agora tenho certeza que você vai piorar bastante.
- Não, não você não é louco, não mesmo. Eu é que devo ser uma insana, uma demente, fico aqui discutindo com você e tomando essa água toda na cabeça quando deveria estar em casa debaixo das cobertas. Pelo menos teria um cobertor para me aquecer... Eu sou uma infeliz mesmo. – chora, espirra, tosse e vira as costas para ir embora.
Ele a segura olha profundamente nos seus olhos verdes (lente de contato comprada em três prestações!) e suplicante diz:
- Espere mais um pouco, veja, olhe, olhe lá – aponta para esquina – veja lá vem outro ônibus...
- Você espera que eu fique aqui para tomar outro banho? Você quer que antes que eu morra de tuberculose pegue uma difteria? Uma febre amarela? Você é completamente louco.
- Louco por você.
- Conquistador barato. Não presta nem para fingir que é um amante latino. – tosse ainda mais forte, espirra tanto que o falso colar de pérolas que ele a presenteou arrebenta e se espalha pela calçada. –Tá contente? Agora acabou de vez. Não tenho mais nada que me prenda a você!
Ele tenta recolher as falsas pérolas, mas nesse momento passa o ônibus que joga água sobre a calçada levando todas as falsas pérolas para o esgoto. Quando se levanta vê que ela está indo embora, corre atrás. Pega-a pelo braço, e sussurra-lhe ao ouvido.
- Mais uma chance, só mais uma chance. Eu compro outro colar para você, mas me dê mais uma chance.
- Chance de quê? De me matar debaixo dessa chuva? Chance de me presentear com outra bijuteria sem valor? Chance de perder meu tempo? – olha para o relógio de pulso, presente do ex-marido – Que vida a minha. – lamuria-se - O relógio não era à prova d’água. Mas não dou sorte mesmo com homem... – começa a chorar, mas é interrompida por uma série de espirros e tosses.
- O que eu posso fazer para provar que você é realmente importante para mim? Diga que eu faço qualquer coisa para provar. Diga – implora miseravelmente.
Tossindo, espirrando ela põe a mão na testa e constata que agora está com febre.
- Me leve a um hospital. Meus parabéns – diz sarcástica – Agora estou realmente doente – espirra.