2011/07/14

A VELHA E A OBRA

Safada.
Safada mesmo.
Dona Elvira é safada em último grau, irremediavelmente safada, safada de fazer estivador ficar corado, com as besteiras que faz e diz.
Cabelo branco pintado de azul, colar de pérolas falsas, boca e unhas constantemente pintadas de vermelho, quadril enorme de matrona sobre duas pernas cambaia. Na cara sobre os olhos míopes uns óculos enormes com armação dos anos sessenta, lembrança última de seus anos dourados...
Todos imaginaram que melhoraria com a menopausa, mas piorou, todos dizem, quase em uníssono:

- Um caso para a ciência resolver.

Agora ela não pode ver os pedreiros da obra em frente.
Toda hora leva um copinho d’água gelada, embora, a princípio, lhe tivessem sugerido levar logo a água numa jarra:

- Dá menos trabalho dona Elvira!

Ela até pensou em explicar que levando de copo em copo iria lá mais vezes, mas resolveu não falar nada.
E lá vai ela para a rua, mas antes de sair passa um pente nos cabelos crespos e batom vermelho nos lábios murchos.
Ao meio-dia, hora do almoço, leva sanduíches, mas antes saca da bolsa o espelhinho redondo e o batom vermelho que espalha pela cara como se quisesse ser vista da lua.
A velha anda quilômetros por dia, indo e vindo da construção, a família entre preocupada e pilheriando, se pergunta onde ela arranja tanta energia nessa idade.

- E com aquele esporão no pé direito... - comenta uma vizinha.

Sessenta e oito anos num cio de cachorra no verão.
Vaidosa, agora toma banho e troca de roupa três, quatro vezes por dia. Mas a mancha do batom parece que não sai mais da cara.
Os netos riem à suas costas, o genro pergunta para a mulher por que ela não herdou aquele fogo todo, a filha morre de vergonha e faz de tudo para mantê-la em casa.
Telefonou para as irmãs, mas não aceitou o conselho de mandá-la para um asilo, sob ameaça de:

- Ser visitada só no Natal e assim mesmo se a data cair num domingo com sol!

Sem resultado.
Os peões que a princípio achavam engraçado, agora fogem dela com medo que um infarto fulminante a mate na obra.
Enquanto uns fazem massa e outros assentam tijolos, um sempre fica de vigia para ver quando a velha aparece.
Um assovio e todos se escondem no almoxarifado.
Dá pena ver a velhinha com a bandeja na mão olhando para a obra vazia, mas ante a possibilidade de ter que explicar para a polícia e a família como ela foi morrer lá, é melhor atrasar um pouco mais a obra.

- Velha assanhada...
- Vixe!!!!!

E os peões voltam a trabalhar, dobrado agora, para compensar o tempo perdido por causa dela...

4 comentários:

Nanda Assis disse...

qro chegar la como ela.
mas o q é matrona?

bjos...

Folhetim Cultural disse...

parece as jovenzinhas de hoje em dia hahaha

solaris disse...

Tenho certeza que ela não ia se importar de morrer na obra, ahh se eles soubessem como morreria feliz....A velha matrona,....

VICIADOS EM CAFÉ disse...

Olha ai Nanda:

matrona |ô|
s. f.s. f.
1. Senhora respeitável que é mãe de família.
2. [Informal] [Informal] Mulher já de idade e corpulenta.
3. Virago.