Vem chegando aquele dia.
Olho para folhinha chego bem perto para poder focar aqueles numerozinhos, para ter certeza que aquele dia está chegando.
Dia 25 de dezembro, mais um maldito Natal, mais uma noite com ceia, gente em volta, presentes sem graça, gente sem graça, gente chata depois de poucos minutos, gente bêbada depois de poucas horas, eu suicida logo em seguida...
O que mais poderá acontecer nesse Natal?
O quê?
Ainda tenho as gravatas do ano passado, as meias do ano retrasado, não tiro os olhos das manchas na parede, uma de cada maldito Natal aqui na minha casa.
O bar está cheio de bebidas importadas, cervejas inglesas e alemãs, que amanhã mesmo vou retirar e esconder em algum lugar onde os cunhados (sim, a gora é plural) não possam farejá-las. Já comprei o que há de pior para ser servido aos convidados, convidados eu disse? Mas eu não convido ninguém para vir em casa, eles é que aparecem, assim como mosquitos no verão, mortes e doenças nas guerras...
Mas o que posso fazer?
Fugir, dizer que vou viajar com a mulher e as crianças?
Não!
Eles seriam capazes de irem juntos...
Uma vez comentaram que seria “ótimo” fazermos, todos juntos, uma viagem de navio. Já me via escondido nos barcos salva-vidas, ou pulando em alto-mar e nadando de volta à praia como um rato que abandona o navio antes de ele afundar (sendo realmente uma pena mergulhar numa água gelada e NÃO ver o navio afundar)...
Logo bati a mão na mesa e disse, quase gritando, um não! Pensando em ficar isolado do mundo junto com eles, preferi tê-los em minha casa, de onde eu sempre poderia fugir pela porta da frente.
Olhando ainda para a folhinha, procuro o telefone da gráfica que a imprimiu, será que possível que eles tenham errado as datas? Antes de ligar, vou contar todos os dias ali impressos...
Droga.
O maldito calendário está certo.
O Natal está se aproximando, cada segundo que perco olhando para esse monte de números com fundo de paisagens e bichinhos...
- Argh! – essa dor no peito outra vez.
Minha mulher diz é síndrome de pânico, mas eu acho que é só o pânico mesmo. Já sinto os tapas nas costas dos – meu Deus, é agora é no plural – meus cunhados. Já sinto a textura dos papeis de presentes vagabundos com os presentes não menos vagabundos com que eles me presentearão.
Na igreja, o padre já me avisou para não doar nada do que eu ganho, não tem saída e fica ocupando todo o espaço reservado aos trabalhos pastorais. Além de me fazerem sofrer, ainda atrapalham na catequização dos infiéis.
- Bando de demônios! – grito, seguido de outra pontada no peito. Com o rosto pálido e com falta de ar, sorrio murmurando comigo mesmo:
- Morro antes do Natal e ferro com a alegria deles...
Mas por um átimo penso:
- E se eles ficarem felizes com a minha morte?
Olhando o calendário, procuro onde minha mulher anotou o número do meu cardiologista.
3 comentários:
Aiiiii como adoro ler seus contos de natal!
E que venham mais!!!!
Gosto muito!
Como sempre de ótima qualidade!
Um bjão!
Poderia mandar um peru envenenado para cada um uma semana antes. Esfomeados querendo levar alguma vantagem como são, não estariam presentes uma semana depois.
Elementar meu caro Roberto
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