2011/06/10

LÉOZINHO E O MAR


Essa era para ser só mais uma das nossas reuniões etílico-literárias. Mas ah!, as coisas que fazemos para agradar as mulheres...

Depois de anos ouvindo os comentários desairosos delas, chamando-nos de bando de poltrões, vagabundos e ignorantes que perdemos nossas vidas em cervejas e caipirinhas, resolvemos nos reunir um sábado por mês (mas só se chovesse) para discutirmos os livros que lemos na nossa juventude, sim, juventude, porque nessa altura de nossas vidas, só temos tempo para ler um jornalzinho e olhe lá...

Mas como dizia quando comecei a divagar, era o sábado aprazado (e sim, chovia) para a reunião, estávamos já quarta ou quinta garrafa de cerveja, e em vozes altas discutíamos o livro O Velho e o Mar, do Ernest Hemingway, como vocês bem devem saber, ou se não sabem segue aqui um breve resumo, que, que ninguém nos leia, saquei do google para impressionar os amigos, afinal nessas alturas já não lembro nem a cor das minhas meias, muito menos livros que li em minha juventude:

“Depois de passar quase três meses sem fisgar um peixe, escarnecido pelos colegas de profissão, o velho Santiago enfrenta o alto-mar, sozinho, em seu pequeno barco. Quer provar aos outros e a si mesmo que ainda é um bom pescador. É em completa solidão que ele travará uma luta de três dias com um peixe imenso, um animal quase mitológico, que lembra um ancestral literário, a baleia Moby Dick.
À medida que o combate se desenvolve, o leitor vai embarcando no monólogo interior de Santiago, em suas dúvidas, sua angústia, sentindo os músculos retesados, a boca salgada e com gosto de carne crua, as mãos úmidas de sangue. Por fim o peixe se dobra à força do pescador. “Mas a vitória não será completa - surgem os tubarões...”

Frisson, uaus e vivas - fez bonito.

A partir daí começamos um papo bem macho, principiamos a discutir pescarias e contar causos e mais causos, quando lá do fundo da sala, Léozinho levantou a mão e disse que também gostava muito de pescaria, logo o Léozinho cuja existência ninguém reparava, pouco faltava para tropeçarmos nele, tão insignificante era sua figura. Olhamos uns para os outros e rimos baixinho, mas rimos. Léozinho gostava de pescaria? Nunca o vimos nem tomando sol na praia...
Pela primeira vez na vida centro das atenções, aproveitou e começou a sua peroração sobre a arte de pescar, mas percebendo nossa incredulidade, resolveu convidar-nos à sua casa.

Fomos!

Rapaz o que vimos na garagem dele, nunca vimos nem lojas especializadas!

E lá começou a apontar para os objetos exposto e a descrever-los:

- Esse aqui é uma carretilha Shimano Curado 201 DHSV, carretilha perfil baixo com 6 rolamentos, capacidade para 110 metros, isso aqui - enquanto descrevia ia vestindo - é um colete Sampo para pesca oceânica, que permite uma rápida junção entre o pescador e o equipamento. Feito em tecido sintético branco telado, que garante o conforto térmico e a ventilação durante a utilização. Ah! Essa isca de superfície desenvolvida por Nelson Nakamura, um dos maiores pescadores do Brasil. Muito eficiente na pesca do Robalo, Robalo que eu preparo com uma farofinhas de camarão... e de várias outras espécies. Tamanho: 9 cm. Esse peixinho aqui na minha mão – quase esfregando em nossas caras – é uma isca artificial Miss Carna, fabricada no Japão. Uma das iscas mais eficientes na pesca no mar. Possibilita ótimos arremessos. Trabalho em zigue-zague. Tamanho: 14 cm. Peso: 40 gramas

Extasiado com as discrições dos materiais, em estado de plena graça, estava quase se elevando do chão. Nunca vimos o Léozinho falar desse jeito, ele estava dando uma aula para a gente.

- E esse alicate então? Com balança para até 17 kg e corda para prender no pulso. Já esse outro alicate é fundamental para embarcar os peixes na pesca com iscas artificiais. Com balança para até 17 kg e corda para prender no pulso. Bóia Paulistinha, a melhor para o robalo. Muito eficiente na pesca com camarão vivo. Bóia Petersen com chicote de aço, muito resistente. Ideal para pesca de carpas em pesqueiros, ou robalos com camarão vivo. Peso: 27 gramas. Case Pelican 1490 a prova d´água, ideal para o transporte de celulares, rádios, máquinas fotográficas, notebook´s e gps´s em embarcações. Totalmente vedado. Com válvula automática de pressão. Fabricado nos EUA. Dimensões internas: 44,5 X 29 X 3,8 cm. Caixa estilo bandeja com profundidade menor, tamanho 34,5 X 21 X 3cm, com travas reforçadas e a possibilidade de ajustar de 5 a 34 compartimentos.

Ele já estava em frenesi...

- Aqui temos um anzol forjado em aço estanhado, próprio para ser utilizado em água salgada. Extremamente resistente perfeito para corricar...

- Péraí - tivemos que interromper - afinal o que é corricar?

Com que desprezo ele nos respondeu, com um desprezo...

- Corricar é rodar, girar uma rodinha ou rodela, simples o Hemingway nunca descreveu isso em seus livros? Francamente... Mas voltando ao assunto, aqui eu tenho as minhas varas de pesca, esta por exemplo possui um conjunto para pesca com mosca, essa aqui é uma vara de grafite, com cabo em cortiça, 9´ de comprimento em 2 partes, 5/6 WT. Linha floating # 6 e backing de dacron 20 lbs. Acompanha um cortador de linha, uma tesoura para retirar a mosca da boca do peixe e 5 moscas variadas.

Enquanto Léozinho falava e descrevia em tom professoral todos os seus materiais de pesca, nos ficávamos mais bestas ainda... Como era complexo pescar!

- Essa aqui é uma caixa térmica que pode ser ligada um acendedor de cigarros de 12 V, conservando os alimentos quentes ou frios. Sem necessidade de gás é perfeita para viagens de carro, para uso em trailers, em vans ou caminhões. Compatível com fonte opcional para uso em casa ou no escritório. Nunca precisa de gelo, portanto termina com o problema de água escorrendo ou alimentos encharcados. Esfria até 22º C abaixo ou aquece até 38º C acima da temperatura ambiente. Uso vertical ou horizontal com bandeja divisória. Porta que pode abrir tanto para a esquerda com para a direita.
Mas enquanto Léozinho aponta com seu chaveiro de mira laser para os apetrechos, começamos a nos cutucar discretamente, mostrando uns aos outros que todo o material estava intacto, como se nunca tivesse sido usado antes. Foi ai que Viviano resolver pergunta a razão disso. Quando Léozinho estava pronto para responder, apareceu Cidinha, esposa dele, e disse:

- Ele só está esperando comprar uma lancha para usar!

Outra surpresa! Léozinho comprando uma lancha para pescar. Logo, se ele iria pescar, nós seus amigos, também iríamos, certo?

Quase!

Diante de nosso espanto diante de sua resposta, Viviano tornou a perguntar para Cidinha:

- É mesmo? E depois?

Olhando profundamente para os olhos de Léozinho ela respondeu:

- Pego as crianças e me divorcio. - Virou sobre os calcanhares e foi embora.

É por isso que eu digo, “Homem que é Homem não perde tempo discutindo livros...”