2012/01/31

DOIS CURTOS CONTOS



AS BODAS NO JARDIM



A bandinha toca a última valsa, os convidados exaustos, agora desabam nas cadeiras, pela grama, onde houver um lugar vago, esperam pela chegada da noite, que promete ser estrelada.
Cansados, escutam os derradeiros acordes que ainda flutuam no ar, começa a escurecer e um friozinho provoca arrepios na pele das mocinhas, que aproveitam para se abraçarem aos namorados, maridos e amantes.
A noite não tarda a chegar, afinal já é outono...
Licores, chás e café quente, em bandejas de prata, são servidos por criados de libré, e por fim, a noite cumpre o prometido enchendo a noite negra de estrelas cintilantes, frias e distantes como que não querendo se comprometer com o que virá acontecer pela frente até o raiar do novo dia.
Os grilos trocam as valsas da tarde pelos cricris, os sapos e as rãs na lagoa ali próxima começam a sua serenata noturna, e sem que percebam, fadas voam sobre a cabeça dos jovens sussurrando velhos poemas de velhos tempos, imemoriais e há muito esquecidas...



Os noivos já se foram para a lua de mel, os convidados mais velhos já se retiraram cansados de festas, de alegrias alheias, azedos e amargurados de tudo nesse mundo, mas os jovens, sem nenhuma pressa, afinal são jovens, continuam sua festinha particular.
Risos e correrias, abraços e beijos, gritinhos, pó de ouro no ar...
A aurora encontrará pelos cantos do jardim esses jovens estirados, fatigados, e que ao despertarem se perguntarão radiantes de alegria, quando haverá outro casamento como esse.
Ah! se essa história se passasse no verão...






AS ONDAS


As ondas estão fortes sob a influencia da sizígia, o barulho das águas arrebentando na praia dá a impressão de ser o fim do mundo, o céu cinza não ajuda muito para tirar essa má impressão, os barcos mal e mal estão amarrados, e batem uns contra os outros. Se o mar não os levasse, dariam fim a si próprios, arrebentando-se em pedaços...
As gaivotas, aquelas que teimosamente persistiam em voar atrás de algum peixe, eram levadas para longe e sumiam levadas pelo vento. Certamente amanhã o mar estará coalhado com os corpos dessas aves.
Nas casas, as janelas opacas pelo sal das espumas batem sem parar e o vento uiva pelas frestas, fazendo os tapetes voarem como se fossem tapetes mágicos dos contos de Aladim. Ninguém sairá hoje para pescar, nem para coisa alguma. Trancados, ficarão a beber cachaça e jogar conversa fora esperando que amanhã o dia seja melhor.
Os mais velhos, para assustarem as crianças, contam histórias de grandes desastres, naufrágios, mortes e peixes gigantes, de homens que nunca mais voltaram para casa... De quando em quando, um troar de meter medo explode no ar e por segundos os homens de calam e as mulheres, segurando as contas dos terços, se entregam ainda mais às suas ladainhas.
Anoitece e a escuridão é cortada por raios que iluminam os céus e fervem as águas do mar, os pescadores calculam o prejuízo dos barcos que se arrebentaram, das redes que o vento estraçalhou, dos peixes que não pescaram, da fome ancestral que os rói por dentro. As águas que vem e vão, levam e trazem uma garrafa, que por fim parte-se nas pedras e deixa que a mensagem em seu interior seja tragada pelas ondas, sendo dissolvida e esquecida para sempre...
Amanhã saberemos que o prejuízo da tempestade foi bem maior que a perda de alguns barcos, umas redes de pesca e umas tantas gaivotas...
Mas assim é a vida.



Um comentário:

Anônimo disse...

MUITO BOM, Roberto!

As Bodas no Jardim, apresenta a nostalgia de todas as bodas. Tudo muito bem detalhado.

As Ondas,

Está perfeito. Triste, pois todo barco por suas idas, vindas e seus movimentos que nos remete a um jogo de bater de asas e ondas, partidas e chegadas.

Excelente!

Beijos

Mirze