2012/12/28

RÉVEILLON





Na espuma vertical

No pipocar da rolha

No champanha no chão

Nos fogos do céu

Nas sete ondas do mar

Tanto tempo se perde

E o ano velho se (es)vai...

E o outro entra

Tal e qual o que se foi...



FIM




A cada palavra lida naquela carta ele sentia-se menor, ao fim e ao cabo da leitura (leu e releu), percebeu que viveria feliz da vida morando dentro daquele envelope. A bandida nem se deu ao trabalho de perfumar ou marcar com batom a folha em que se despedia...


2012/12/19

AREIAS




Das arábias

Num tapete

Para trás ficaram

As areias

Os camelos

As mulheres

Os mistérios

Hoje olhos vagos

Perdidos no horizonte

De concreto e fios elétricos

Só param de sonhar

Quando "a breguês"

Entra “no lojinha”




2012/12/17

NATAL, OUTRO NATAL DO RANZINZA



Me enganei, me iludi, tentei cobrir o sol com peneira, ousei ter esperanças, que furada! Nada muda nesse mundo imutável, duro de pedra. As coisas são como são e tolo é aquele (eu, por exemplo) que pensa que alguma coisa pode mudar...

Bestamente achei que esse ano (crendo talvez no fim do mundo? Pode ser!) o Natal, aquela data para sempre e sempre amaldiçoada, seria diferente.

Mas não, ela (a data) provou-se ser igual às outras passadas (e pelo que vejo futuras) será igual.

Ontem, domingo, no Café, um grupo musical cantava músicas Natalinas e eu lá me embevecia ouvindo-as acompanhando algumas cantando outras assoviando.

Feliz com aquilo, sorrindo, sorvia meu cafezinho.

Até que lá pelas tantas cantaram “Boas Festas” de Assis Valente, quando chegou a vez do:

Mas o meu Papai Noel não vem

Com certeza já morreu

Ou então felicidade

É brinquedo que não tem


Veio-me uma pontada tão aguda no coração que quase verti lágrimas. Respirei fundo, mantive a pose, a dignidade, mas com que inveja via as famílias abraçadas cantando todos juntos e desafinados aquela música!

Deus! Anos e anos de vida, mais de meio século e nunca tive um Natal que se dignasse a ser lembrado com alguma alegria, júbilo, contentamento.

Em retrospectiva meus natais são dignos de Charles Dickens. Só faltam a fome e a neve.

Nunca fui feliz nessa data, nunca ninguém ao meu lado. Sempre só, sempre me remoendo de raiva, sempre frustrado.

Se arranjasse um “bico” nessa data juro que trabalharia com prazer, faria o turno da noite.

Após o Café fui a uma Igreja ouvir mais cânticos, me sentia como um miserável diante de uma vitrine de doces ou de brinquedos vendo o que jamais teria...

Me pergunto se em minha infância meus pais enviaram mesmo minhas inocentes cartinhas para o “bom velhinho” ou se simplesmente as jogaram no lixo!

Logo esse ano se acaba e o outro começa igualzinho, igualzinho a esse que se vai. Meu fim se aproxima cada dia mais e nada de chegar a ter um feliz de Natal. Depois me perguntam por que olho atravessado para papais noeis e tenho vontade homicida de chutar pedintes, queimar árvores, enfeites e tudo mais.

Vou me entupir de programas repetidos TV, evitarei as retrospectivas, não atender telefone (como se alguém fosse realmente ligar), comer alguma bobagem aquecida no micro-ondas e dormir cedo enfiando a cabeça sob os travesseiros para não ouvir os fogos.

Antes de morrer totalmente sozinho, amargurado e com um cachorro magro e famélico amarrado no quintal, ainda mudo meu nome para Scrooge!

- Que venham meus fantasmas!

Juro que o primeiro que me desejar um “Feliz Natal” eu mato.





2012/12/12

“AQUELA DATA” OUTRA VEZ



Feliz é o Rodrigo, longe de todos e possivelmente com neve.

Nem parece que “aquela” data está chegando!

Estou anormalmente calmo, desestressado, sem rompantes, afável, agradável. Olho as vitrines enfeitadas sem engulhos ou calafrios. Não penso em dar rasteira nas velhinhas com sacolas, até cumprimento um ou outro nas ruas.

Ando sorrindo, mas percebo que assusto aqueles à minha volta. Mas compreendo que deve ser mesmo assustador essa cena.

Ok, o calor me incomoda e me enerva, mas ainda não é culpa “daquela” data.

Já comprei até alguns presentes, besteiras, umas lembrancinhas para não deixar essa data passar batida...

Para quem não me conhece, nem imagina a evolução que é isso. Uns dirão que a minha provecta idade está me amolecendo, não os contrariarei!

Vejam só, não vou contrariá-los!

Deve ser o sinal dos tempos. Ou minha esperança no fatídico fim do mundo antes daquela data. Sei lá.

Lá fora (estou trabalhando agora) o foguetório estourou possivelmente vitória do Corinthians. Conferi n e ganhou de 1 x 0.

Isso deve alegrar a patuleia e incomodar à hora do almoço, mas seguirei fleumático e superior, nada há de me abalar até o fim do ano ou fim do mundo, o que vier primeiro.

Até agora nada de convites, fugi de todos os amigos secretos do serviço, não fui à confraternização, nada de almoçar com colegas do escritório. Não quero me arriscar.

Preservo-me de aborrecimentos. Essa luta, nesse ano, não há de ser inglória como em anos passados.

Não chutarei os velhos fantasiados gritando os eternos e indefectíveis:

- Ho ho ho ho!

Não olharei para eles com sanha assassina, mas não me pouparei de desejar-lhes uma leve desidratação (ainda há um pouco do velho EU dentro de mim).

Se estou mais light não quer dizer que entreguei os pontos, que vou me irmanar com o próximo, nada de abraços, beijos e tapinhas nas costas. Não, não vou não.

Resumindo, ainda continuo o velho amargo de sempre.

Não se iludam e nem se arrisquem.


2012/12/05

COMO É EMOCIONANTE SER EU


(fragmento de uma carta)




Voltava para casa ontem à tarde quando na rua alguém chama meu nome, olho em direção de onde veio a voz e vejo “J”, notório alcoólatra. Antes que falasse meu nome outra vez fui a ele, que sentado a uma mesa de metal enferrujado, mostrava que há muito estava já bebendo. Acho que nunca o vi sóbrio, aliás², podendo evito-o.

Perguntou-me se estava tudo bem comigo.

Medi-o de alto a baixo e olhando profundamente em seus olhos vermelhos e ejetados respondi que:

- Sim.

Nada mais lhe disse ou dei oportunidade de dizer e virando-me fui embora.

Veja como é emocionante ser eu!