Caríssimo,
desculpe-me a ausência, mas essa missiva traz-lhe boas novas.
Conheci
acidentalmente uma moça muita linda. Encontrei-a numa inesperada ida minha à
praia. Sabe bem o bom amigo o que penso de passeios à beira-mar, sobre o sol na
cabeça, a luz nos olhos como sabe, isso me remete à desgraça de Mersault, mas
o Destino, sim com “D” maiúsculo
sempre nos prega peças... Sim estava a
andar a esmo, pensando na falta de sentido da vida, quando – Louvado seja Deus!
- a vi dentro d’água (quase ouso dizer que eu a ouvi antes de vê-la)!
Sem pensar
e sem dar por mim, me vi pulando ondas, mergulhando, nadando como se tivesse
feito isso toda a minha vida. Não sei por quanto tempo dei braçada e mais
braçadas até que me aproximei dela – e ela cheirava a sal...
Faltam-me
palavras, verbos, substantivos, adjetivos, falta-me toda uma gramática, um
alfabeto para descrevê-la (dominasse eu o grego!), e por isso não o farei aqui
e nem em meu último suspiro, por isso peço-lhe: SIMPLESMENTE CREIA EM MIM!
Ficamos
horas a conversar boiando nas ondas, mas meus olhos, minha alma, todo meu eu
afundava-se naqueles olhos verdes...
Nesse
mister passou-se todo o meu dia, somente ao por do sol, despedi-me dela.
Perguntei
onde ela morava, como poderia encontra-la outra vez, e ela, olhando para o
horizonte sem fim, respondia com doces negativas e um sorriso que levaria
qualquer outro homem à loucura. Qualquer outro homem que não esse seu amigo
versado em ciências do absurdo e do oculto à vista de todos...
Arrisquei-me
a inquirir seu nome, e num sorriso lindo, sua resposta:
- Ligeia.
O sol já
começava a se pôr, seu reflexo na água me ofuscava, e quando cheguei perto para
abraça-la, num pirueta, mergulhou e desapareceu... As gaivotas grasnavam em
coro, elas riam de minha angustia, de minha dor, lembrei-me nesse instante a
razão de minha antipatia pelo mar.
Caríssimo,
esse tempo sumido se deve à minha insensata busca por ela. Ando de praia em
praia:
- Ora gritando:
- Ligeia!
Ora
murmurando:
- Ligeia!
Assim passo
meus dias n’água, ando mais enrugado do que deveria nessa minha provecta idade.
Acho que já estou ficando com meus cabelos verdes... Meu bronzeado já está
transformando minha pele em papiro, há vezes em que, chegando em casa após o
dia inteiro na praia, não me reconheço em frente ao espelho.
Caríssimo,
o amor na nossa idade é realmente um risco fatal!
Minha vida
mudou, estou irreconhecível, sem perceber, alterei drasticamente meu modo de
viver e me alimentar, duvida?
Veja a
receita que lhe envio:
SALADA DE
ALGAS E PEPINO
Ingredientes:
– 25 g de mistura de algas secas
– 1 pepino pequeno
– 75 ml de mirin
– 75 ml de vinagre de vinho de arroz
– 2 colheres de sopa de açúcar amarelo
– 2 colheres de sopa de sumo de limão
Faça assim:
1.
Ponha as
algas de molho numa taça com água fria e deixe repousar 15-20 minutos para
amolecerem;
2.
Corte o
pepino ao meio no sentido do comprimento e depois às meias-luas muito finas
Ponha as algas, grosseiramente picadas, e o pepino numa tigela;
3.
Misture o
mirin com o vinagre de vinho de arroz e o açúcar num tacho pequeno e leve a
lume brando até o açúcar dissolver. Retire do lume e deixe arrefecer. Junte-lhe
o sumo de limão;
4.
Deite o
molho de vinagre sobre as algas e o pepino e envolva cuidadosamente. Sirva em
taças pequenas ou pratos individuais.
A princípio
você deve estranhar, mas com o tempo e uma paixão avassaladora, logo se
adaptará.
Caríssimo,
estou um homem muito velho para tais emoções, enquanto traços essas linhas, uma
voz doce canta em meus ouvidos, a dúvida me rói. Será Ligeia?, será a loucura
que já me come pelas beiradas?
Aguardo
resposta.
P.S.
Envio-lhe essas conchinhas. Uma de cada praia a que vou.
P.S².
Espero que goste da salada.
Abraços
salgados.
4 comentários:
Simplesmente bárbaro, adorei Roberto...
Obrigado!!!
Muito interessante Roberto.
E olha como o Mar é realmente Divino, estava você "andando a esmo, pensando na falta de sentido na vida" e de repente Ligeia. Foi o mar que te trouxe um sentido para a sua vida: a busca pela Ligeia.
Obrigado pelo comentário Lenir.
continue seguindo ese blog!
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