Brigavam. Qual
casal não briga? Discutem, tem lá suas diferenças! Seus pontos de vista
divergentes! Contrastantes! Brigam por uma parede azul que deveria ser verde,
de irem pela direita quando ela (sempre ela) que ir pela esquerda, por muito
sal, por pouco açúcar!
Brigaram.
Discutiram. Sabe-se por que, qual a razão (se é que havia uma razão, um com
razão, ou os dois errados). Disseram-se palavras duras. Feriram-se com terríveis
pejorativos, feios predicados, lembranças deturpadas, vomitaram todo o fel.
Brigaram,
viraram a cara um para outro, cada um seguiu seu caminho, tropeçando em cada
pedra do caminho, errando as escolhas em cada encruzilhada, trocando Norte por
Sul, Leste por Oeste, erraram enfim por caminhos outros...
Separaram-se.
Mas o tempo
passa, às vezes passa por cima da gente, ora por cima dos problemas, mas o
tempo passou...
O fulano (não
declinarei o nome, não percam tempo ligando para a redação!) tornou-se mais
amigo que antes. Andávamos juntos e eu a ouvir-lhe as lamurias, a
ver-lhe lágrimas correndo pela cara, assistir seu lento desmoronamento – que
começava pela corcunda recém-adquirida, sola dos sapatos gastos...
Mas o tempo
passa. O tempo nos afasta dos bons e dos maus...
Um dia, anos
depois reencontrei esse amigo. Abraços, tapinhas nas costas e a famigerada
pergunta:
- Vamos beber?
- Vamos! (fomos)
Ele me conta
que hoje estão casados, felizes, sem filhos, (talvez por isso felizes?) (cartas
pra a redação!) ainda pressuroso. Cheio de dedos pergunto, com muito rodeios,
como foi que acabaram se acertando (bem que poderia ter perguntado sobre o
sentido da vida, mas não!)...
Ele ri. (achei
bom sinal, há muito não o via sorrir, quantos mais rir à bandeiras
despregadas), então ele me conta:
- Louco o
negócio, muito louco, até para os meus padrões de loucura. Passamos meses
separados ruminando ódios, pensando besteiras, aquela desgraça toda que nos
passa pela cabeça quando estamos sós, sabe? (não, não sei!, garanto-vos!). Ela
não respondia meus telefonemas, as cartas eram devolvidas... Aquela miséria
desgraçada que você (eu) acompanhou, (nada disse – sou discreto como um
cavalheiro inglês - mas ele acabou ficando meio curvado..., mas guardei essa má
impressão, afinal ele me parecia realmente feliz) até que um dia ela aparece em
casa trazendo uma cesta de palha (palha? Acho que era de vime, mas deixemos
isso pra lá). Olhou-me nos olhos, aqueles olhinhos amendoados, apertadinhos,
míopes, úmidos, e disse que aquilo era para mim. Olhei para a cesta entre
espantado e encafifado, mas sabe como são as mulheres, não é (sim eu sei, não
entendo, mas sei como são...) e não disse nada, mas evitava ficar olhando muito
para a cesta, quando, passada a emoção de me ver (mulher é besta mesmo) ela
disse:
- Dia desses,
andando pela feira lembrei de você. Comecei a chorar, mas como chovia ninguém
percebeu. Quanto mais chorava mais lembrava de você (quem as entende?) até que
passei por uma barraca cheias de umas flores tão exóticas, mas tão esdrúxulas
(e olha que essa mulher o amava...) que não me contive, comprei essa dúzia que
tinha lá, fiz essa cestinha com amor e vim aqui te pedir desculpas e perguntar
se você me aceita de volta...
Confesso que
quase me emocionei, mas segurei a onda, antes de tudo sou um forte!
Contou-me que
se abraçaram, se beijaram e, que emocionado confessou-lhe que hoje, sim hoje,
hoje mesmo, naquele maravilhoso momento ele chegara à conclusão que ela era mulher
de sua vida, sua alma gêmea, a outra metade da laranja!
- Catso! - Como
você chegou a tal conclusão? (já estava me irritando com tanto drama!)
- Cara, ela
tinha trazido para mim uma cesta cheia de alcachofras! Ela confundiu flores com
legumes, mas fez isso por amor por mim. Chorei junto com ela!
Abracei-o
fortemente, (quase o quebrei ao meio), desejei-lhe toda felicidade do mundo,
olhei para meu relógio, dei-me um tapa na testa e disse-lhe que tinha um
compromisso inadiável.
Fui-me.
Nunca mais o vi*.
4 comentários:
Só faltou o tradicional "o quê você quis dizer com isto?". Nessa nem alcachofra segurava o cidadão.
Há controvérsias sobre alcachofra ser flor ou legume. Seria por acaso um ser alienígena com poderes mentais para unir casais briguentos? Não sei, nem me pergunte...Devo ter comigo muita alcachofra ultimamente e acabou afetando meu discernimento sobre a alcachofra, o universo e tudo mais!
42?
Prado li agora Legumes e Flores...no meio do texto não deu para segurar só emoção em forma de lágrimas💙
Postar um comentário