O Taco de baseball
O Imperialismo Norte-americano.
Ou
De como conseguiram transformar em acessório, quase ícone indispensável, a posse de um taco de basebol para defesa pessoal em caso de invasão de zumbis devoradores de cérebros, invasão extraterrestre ou simples assalto à residência.
- Que nada, ainda estou tonto só com o esforço para bolar o título. Agora não tenho idéia de que direção tomar. Olho para as minhas anotações e perco o fôlego. Veja aqui esse monte de lembretes, notas, rascunhos, recortes de jornais, revistas, cartas que os amigos me enviam... Não sei por onde começar a escrever... Aqui por exemplo, nesse recorte de jornal, veja só, um sujeito, ele destruiu o próprio computador com um taco. Enquanto os familiares tentavam conter sua fúria contra o aparelho, ele gritava que o computador dava-lhe ordens sub-reptícias para matar a mulher e os filhos. E olha que quase conseguiu... Depois a família dele quis acionar a justiça contra a loja que vendeu-lhe o taco. Mas você acha que vou usar isso na minha tese, acha? Outra matéria, e nem me pergunte onde arrumei isso, descreve como um skinhead satisfazia-se sexualmente com o dito taco... Penso que não acertei na minha escolha de defesa de tese... Esses americanos são uns psicopatas... Onde estava com a cabeça quando resolvi defender essa maldita tese? Sabia que há tacos de alumínio?
- Não...
- Pois é nem eu, para mim aquilo era feito de madeira torneada e pronto! Mas não, os “irmãos” do norte tinham que complicar, para eles nada pode ser simples. Eles tinham que complicar... Já não bastava o jogo ser abstruso...
- O quê?
-Abstruso é o mesmo que complicado!
- Ah! Depois são americanos que complicam tudo...
- Não obstante minhas dificuldades, os colegas de classe começaram a enviar perguntas, com se eu fosse um fanático, um expert em baseball. Leia aqui, aqui nesse papel amarelo, veja a pergunta desse sujeito. Deixa que eu leio, já que está na minha mão mesmo: - Como fazer a bola de baseball sair do estádio e conseguir passar por todas as Home Plates, fazendo o famoso Home Run?
- ??
- Pois é. Essa foi minha cara a ler esse papel. Eu que nem sei quantas bolas rolam num campo de futebol, fui me meter nessa encrenca! Tudo que eu queria escrever era sobre o desenvolvimento do objeto criado para o esporte que com o tempo passou a ser usado como arma de defesa e depois em ícone de uma cultura estrangeira invasora. Mas não, todos querem que eu explane sobre o esporte! Sobre o esporte. E eu lá sou homem de esporte? Eu sou um teórico do esporte. Eu não pratico esporte. Eu leio críticas sobre o esporte! Maldita hora que me meti nisso! Sabe o que é pior nesse encrenca toda? Sabe?
- Acho que você vai me contar de qualquer maneira, não vai?
- Pior que a minha solidão intelectual é a indigência de minhas amizades! – suspira. O pior, o que está me levando a desistir dessa tese é esse outro papelzinho aqui. Veja isso! Duvido que você entenda, mas dê uma olhada nisso. Veja se essa indagação ajuda em alguma coisa na defesa da minha tese?
- O que é Força Centrípeta sabendo-se que F = (m*V^2)/R, sendo m=massa, v= velocidade, R= raio da curva?
- Viu? Desisto dessa tese. – Joga todas as sua anotações pela janela, fazendo uma chuva de papeis picados caírem em direção à rua, deixando as crianças exultantes de alegria. – Desisto. Nunca deveria ter começado essa porcaria de Tese. Tô fora.
- Você nunca vai ser ninguém na vida mesmo! Essa já é o quê? A terceira Tese que você abandona?
-É sim. Mas um dia, eu hei de conseguir desenvolver um assunto que ninguém – diz contorcendo os dedos das mãos, e olhando para cima – ninguém conseguirá interferir, ninguém conseguirá entender, ninguém conseguirá me interromper... E nesse dia, nesse dia...
Toca a campainha e a enfermeira entra para trocar a frauda geriátrica dele.
- Seu Altamir, se continuar com essa agitação vou ser obrigada a sedar o senhor outra vez. O senhor tem que parar com essa mania de viver defendendo tese. Faça como o seu Gervásio que pensa que é Napoleão, arrume uma guerra, vá traçar planos para invadir Marte ou a Polônia, mas pára com essas sua teses. Olha só o estado do seu Carvalho aí ao seu lado. Toda noite nós o pegamos invadindo a biblioteca para pesquisar as bobagens que o senhor fala durante o dia. O seu Carvalho não tem mais idade para ficar escalando as estantes, um dia desses vamos encontrá-lo morto e a culpa será sua, só sua, pense nisso. – Diz isso enquanto acaba de passar talco nas suas nádegas irritadas pelas brotoejas. – Agora tome a sua sopinha e trate de ir para a caminha.
Ela dirige-se à porta do quarto para sair, mas antes vira-se e fala.
- Antes que o senhor resolva sair daqui às escondidas, já vou lhe avisando que achamos e já devolvemos o taco de baseball do seu neto.
Ela sai do quarto, mas ainda é possível escutá-la resmungar:
- Era só o que faltava esse velho gagá fazer, roubar os brinquedos do neto...
3 comentários:
MUITO BOM!
Lembra o livro "Leite Derramado " de Chico Buarque. Quem não morre cedo passa por isso.
A vida é cruel!
Beijos
Mirze
Eu irei antes..
Ô gente, obrigado pelos comentários
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